Alma Sangrada
Socorra-me, meu Deus, que sofro tanto!
Minh’alma sangra e grita: Liberdade!
Meu corpo fraco espera piedade…
Perdido assim nos mares deste pranto!
Socorra-me, meu Deus, que sofro tanto!
Minh’alma sangra e grita: Liberdade!
Meu corpo fraco espera piedade…
Perdido assim nos mares deste pranto!
A noite por que passa a negra ave
Varria, tristemente, o véu do mundo…
No denso santuário, a voz suave
Cantava, junto à lira, num segundo.
Os passos do passado são tormentas
E espasmos me causando pesadelos…
Produzem, nas raízes dos cabelos,
As mortes melanínicas e lentas…
A cada passo, um passe… Tomo posse
Do afago que me afoga no Prefácio…
O tempo-espaço passa e se contorce
Na última flor do Lácio…
O sofrimento cintilante impera
No reino humano, onde o amor suspira…
A vida sofre e todo o céu delira:
A morte espreita nossa atmosfera…
Hei-de pedir-te, amor da minha vida,
Que não te vás, assim tão de repente…
Meu peito gela e fica descontente
Imaginando a tua despedida…
Amor que desmorona lentamente
na dor que se sucede devagar…
Rancor que renascendo conivente
conforta o coração a lamentar…
Eu vi aquele vulto na parede
tentando proteger alguma cousa
confuso como pássaro que pousa
na vastidão da noute, mas com sede…
Cortante qual adaga o peito fura
o teu amor singrou-me loucamente…
Tal gavião audaz na desventura
voei, chorando, ao céu entorpecente.
O gás carbônico premeu os ares,
pulmões, amores, vidas e direitos…
Desvirginou corais rudimentares,
turvou os mares, antes tão perfeitos!
Se grafas graves medos nas memórias
nas greves breves dos papéis diversos
o grito grifa dores mil em versos!
Das grossas grotas fogem as histórias:
em grupos grulham novos universos!
Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.
Alphonsus de Guimaraens
O lodo putrefato nas cidades
tem lama, sangue e barro revolvidos
às lágrimas tristonhas de saudades
e a crimes impensáveis cometidos…
A tarde que retumba os vãos sabores,
a mesma que nos traz as alegrias,
sussurra bem baixinho dissabores
e arrasta-me por foscas rodovias…
Dormindo sobre os seios perolados
da airosa dama - deusa dos meus sonhos!
Afundo-me em desejos e pecados
e imerso, tenho intuitos mui bisonhos!
Deitar-se em versos do mais ledo horror
ao descrever o tão cruel vazio
É como o altar do meu mais negro amor
chovendo os ais durante o crasso estio…