Desde pequena, Diana aprendeu a sobreviver com pouco.
O afeto, para ela, era um luxo distante.
Nunca teve bonecas, aniversários com bolo ou histórias para dormir.
Teve apenas um colo: o do pai. Um homem de poucas palavras, mas de gestos que ela interpretava como amor.
A mãe? Era um nome ausente, um vazio do qual ninguém falava.
— Foi embora quando você ainda era um bebê… — diziam os vizinhos, desviando os olhos.
Diana não se importava. Tinha o pai.
E o que ele lhe dava era tudo o que conhecia como amor.
Até o dia em que, aos dezenove anos, aquele homem que era seu mundo recebeu o diagnóstico: câncer.
E a vida, já amarga, virou um pesadelo.
Diana mergulhou numa batalha desesperada para salvá-lo.
Trabalhou em tudo o que pôde — faxinas, balcões, noites em motéis baratos.
Vendeu sua coleção de discos raros, seus mascotes, parte de suas roupas, celular, computador, o corpo…
Vendeu até a alma.
O câncer roubou a sua juventude.
Fez de tudo. Tudo por ele.
Foram cinco anos de luta e, após tanto tempo, nada mudou…
Seu pai se foi numa manhã fria e cinza de Agosto. Não houve palavras. Só o silêncio.
Um silêncio que começou a doer na garganta mais que qualquer grito estridente.
Tudo o que conseguiu até esse momento foram cicatrizes indeléveis e nenhum resultado positivo…
O universo parece realmente não se importar com suas necessidades…
Diana afundou num luto sem fim. Tentou seguir, mas o mundo era um lugar sem cor e vazio.
Carregava o peso de tudo o que fez, dos sacrifícios, das feridas abertas.
E os traumas acumulados se multiplicaram, e além disso, agora tinham vozes…
Sussurravam coisas em seu ouvido. Vozes que vinham da escuridão.
Foi então que decidiu procurar sua mãe.
Ela certamente estaria em algum lugar tendo uma vida boa, confortável…
Se havia alguém neste mundo que poderia explicar sua existência, era ela.
Diana queria saber o motivo de sua mãe tê-la deixado sozinha com seu pai, um homem tão bom e honesto …
Queria saber o por que teve que enfrentar o mundo sozinha, sem um colo ou um ombro para chorar, quando, em vários momentos, precisou… Queria saber o que fez para merecer o abandono ainda na inocência…
A busca foi longa. Dolorosa. Mas ela era obstinada.
Depois de 9 anos de buscas, pesquisas e, praticamente, montando um quebra-cabeças,
encontrou o que procurava: a verdade.
Sua mãe nunca a abandonou.
Sua mãe, ainda gestante, desapareceu sem rastro exatamente no ano em que Diana nasceu…
O corpo foi encontrado somente três dias após o rapto, num matagal, com os restos da placenta ainda ligados ao ventre mutilado, lívido e enrijecido pelo sol…
Violentada. Descartada como um animal qualquer…
E o homem acusado de tê-la levado?
Ninguém sabia, mas a polícia tinha um único suspeito:
O homem que Diana conhecia como pai.
Diana sentiu o restinho da sua alma quebrar em pedaços. O herói, o protetor, o amor da sua vida…
era, não só um monstro, mas o pior de todos os monstros que Diana ouviu falar.
Nem mesmo nos pesadelos mais horrendos que teve, tampouco nos filmes de horror os quais
ela havia assistido chegou a ver tamanha crueldade…
As investigações apontavam para ele como autor de pelo menos outras dezessete mortes semelhantes.
Mulheres jovens. Grávidas. O padrão se repetia, exceto pelo fato de todas as outras terem sido encontradas ainda com o bebê no ventre.
E sua mãe… aparentemente… fora a última.
Pelo menos até Diana nascer.
A polícia suspeitava que o assassino seria o pai de todas as crianças vítimas,
mas após uma série de exames de DNA para ligá-las, não houve confirmação…
Cada criança tinha seu próprio pai, na maioria das vezes, casados.
As vítimas, no entanto, mulheres que viviam às margens da sociedade, cujo o desaparecimento raramente faria falta ou geraria busca de algum parente.
Mas Diana era, de fato, filha do assassino, motivo pelo qual a polícia acreditava
que ele não conseguiu abandoná-la após matar sua mãe, como nos outros casos.
Mas para ela, isso não significava nada. Apenas tornava a dor mais aguda.
Fora criada e educada na toca do lobo… Sob os cuidados de um monstro indescritível…
Como amar uma besta monstruosa desse nível?
Como seguir sabendo que o rosto que ela via no espelho era a lembrança viva de um horror?
As vozes voltaram. Gritavam agora. Sua mãe. Seu pai. Ela mesma, em versões distorcidas.
Espelhos que sussurravam coisas que ninguém mais podia ouvir — nem deveriam.
As cicatrizes começaram a pulsar como se estivessem vivas…
E um dia, Diana parou.
Deixou de procurar sentido. Deixou de lutar.
Naquele apartamento pequeno, com as paredes cobertas por recortes de jornais antigos, fotos queimadas e sangue, muito sangue por todos os lugares Diana simplesmente sumiu…
O corpo nunca foi encontrado. Apenas um espelho quebrado, sujo de sangue…
Alguns dizem que ela enlouqueceu. Outros, que partiu em busca das outras filhas esquecidas…
Mas, às vezes, em noites de silêncio pesado, moradores dizem ouvir alguém chorando no prédio agora abandonado.
E quem tem coragem de olhar nos espelhos do corredor jura ver olhos femininos observando — olhos cheios de dor.
E raiva.